quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Rali Monte Carlo '12 – A visão do adepto

Como colaborador deste blog que respira paixão pelos ralis por todos os lados, nao poderia deixar de escrever este artigo que reflecte um pouco da magia e espírito vividos na minha estreia no Rali Monte Carlo.


Depois de mais de 200 kms percorridos em auto-estrada desde o aeroporto de Marselha, começa-se a descer para o Mónaco e quando se avista lá em baixo o quadro do circuito de F1, com o mediterrãneo e os imponentes iates e veleiros, sente-se um arrepio no pêlo: estamos na capital histórica do automobilismo mundial. Continua-se a descida até entrar no traçado do circuito, apercebendo-nos que afinal as curvas são ainda mais fechadas e a largura ainda menos do que parece até que a entrada no famoso túnel estava cortada ao trânsito. Finalmente lá estacionámos a nossa humilde carrinha entre uns raros Ford GT e BMW Z8 e começa-se a respirar “rali”, chegados ao parque fechado onde descansavam os World Rally Cars dos melhores pilotos do mundo. Jantar rápido num italiano com janela para a difícil direita Sainte Devote, uma passagem ligeira pelo La Rascasse, bar que recebe o nome da famosa curva onde se encontra e toca a dormir pois no dia seguinte o Col du Turini esperava-nos.
O troço tinha sido cortado ao público às 07:00 da manhã pelo que o plano passou por subir directamente até ao Col du Turini, e que subida! O acesso que passa por Peira Cava é já um autêntico troço de rali, são mais de 20 kms de um asfalto “vintage”, ladeado pelos típicos muros e onde não se descansa ao volante. Gancho para a direita, gancho para a esquerda, curvas de 90º a não faltarem, sempre em subida, numa estrada de montanha que deixa à vista paisagens magníficas. De km a km vai aparecendo uma placa indicativa da distância que falta até ao Col e da altitude já atingida, que lá em cima perfaz cerca de 1614 metros. Conseguímos estacionar pouco depois de passar a placa dos 4 kms o que já não foi mau pela antecedência de quase 4 horas até ao início do troço. Pouca polícia, muitas caravanas, algum gelo e uma barraca italiana para recarregar energias. Chegados lá cima, começa-se a entender pouco a pouco o porquê de ser tão mítico e especial: ali respira-se a história do Mundial de Ralis. Sem gelo nem neve, claramente que é uma zona muito menos espectacular que o nosso antigo Confurco ou o popular gancho catalão de El Priorat, mas toda a envolvência e ambiente tornam-no um autêntico museu vivo dos ralis. 
E que museu se descobre quando se entra no bar/restaurante do Hotel Les Trois Vallées, recheado de fotografias, quadros, cartazes, postais, a maioria autografados e tanta outra memorabilia dedicada ao Col du Turini e ao Rali Monte Carlo. À saída do restaurante uma barraca de merchandising onde se faz fila para comprar uma lembrança e eis que se vislumbram a chegar ao hotel dois Lancia Delta HF Integrale Evoluzione de estrada...o pendura de um deles, Monsieur Ari Vatanen: “- Portugal? Nice country. Good people. Obrigado!”.
Antes de escolher um ponto da subida que se inicia em Moulinet para a primeira passagem (o Col du Turini ficava para a passagem nocturna), tempo ainda para a paragem obrigatória no Aubergue du Col du Turini para provar o tradicional Vin Chaud, um vinho quente que sempre ajuda a afastar o frio dos alpes. Apesar dos milhares de espectadores presentes a polícia e os marshalls dão praticamente liberdade total para a escolha do lugar pelo espectador, mas a verdade é que o comportamento do público nao deixa de ser responsável. Após o recital de condução de Jean Ragnotti num dos Renault de segurança, os primeiros ruídos do motor do DS3 WRC de Sebastien Loeb que se ouvem ao longe disparam ainda mais os níveis de ansiedade. Muito espectáculo, muitos aplausos e após a passagem do último carro pilotado pela simpática Louise Cook, romaria acima de volta ao Col du Turini onde a confraternização e a festa estavam a entrar no auge.
Ali podíamos perguntar em bom português a outros fans tugas sobre os tempos do Armindo Araújo, saber junto dos franceses como se chama a mascote da Michelin que estava de visita também ao rali, discutir com os espanhóis sobre a competitividade do Dni Sordo e do seu Mini, debater junto dos italianos quem seria o verdadeiro sucessor no Mundial de Gigi Galli, recordar aos alemães que continua a ser Armin Schwarz quem detém o recorde no salto da pedra sentada e ainda picar os checos com o duelo que Martin Prokop travava com o nosso conterrãneo. De facto, um autêntico Parlamento Europeu dos Ralis onde não faltavam também muitos nórdicos e suiços. Já de noite, o ambiente está completamente ao rubro: fogueiras, very lights, fogo-de-artfício, buzinas, cânticos, hinos e os flashs intermináveis que aparecem com o apogeu da passagem dos heróis, levando ao rubro todo o público presente. Tudo isto com um céu estrelado que ajudava a iluminar uma zona onde estrelas do passado como Björn Waldegård, Sandro Munari, Walter Rohrl ou Henri Toivonen já tinham também brilhado.
Depois do Turini, uma passagem ainda pelo parque de assistência onde os fatos-de-macaco dos mecânicos contrastavam com as mini-saias e saltos altos das monegascas que iniciavam “outra festa”. Domingo foi dia apenas para a valiosa “power stage” que tinha o seu final no Col de La Madone, onde nos encontrávamos para saudar com alegria e bandeira nacional a chegada ao top-ten final da dupla portuguesa estreante Armindo Araújo / Miguel Ramalho.
Estava terminado o Rali de Monte Carlo 2012 e a vontade de regressar em breve já se começava a sentir.  

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